Conheci ontem e virei fã. Fico feliz que encontrar ressonância em minha percepção do mundo. Agradeço a Pierre Rabhi, por aglutinar agricultura, beleza e simplicidade. E, sobretudo, obrigado ao Insituto Humanitas Unisinos por trazer estas pérolas e compartilha-las.
Pensador da ecologia concreta e agricultor, Pierre Rabhi promove há décadas um ideal de vida sóbrio e uma mudança global da sociedade.
A reportagem é de Teicir Ben Naser, publicada na revista Témoignage Chrétien, 05-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
É possível realmente fazer a revolução cultivando o próprio jardim, como parece que você propõe?
Cultivar o próprio jardim é um ato político e um ato de resistência. Vivemos em um sistema totalitário que não diz seu nome: as multinacionais impõem as suas regras a toda a sociedade. Esse sistema nega aos cidadãos a possibilidade de serem autônomos. É hora de passar de cidadãos passivos para cidadãos ativos. A ação, ainda que pequena, pode contribuir para uma insurreição global, uma insurreição das consciências. Uma vez que haja essa conscientização, tudo é possível.
Hoje, podemos ler e ouvir por toda a parte que o mundo vai mal. Mas dizer isso não basta. É preciso propôr uma alternativa para destravar o movimento. É preciso associar o dizer e o agir: o que eu digo eu faço. Se hoje tenho essa credibilidade junto a um certo público, é justamente porque eu não permaneci no espírito doutrinário das coisas e tentei que se pudesse viver de forma diferente: alimentar-se de forma diferente, construir de forma diferente, tratar-se de forma diferente, cultivar de forma diferente.
Como começou a sua trajetória "insurrecional"?
Fui com outras pessoas para a região de Ardèche no início dos anos 1960. Comprei uma fazenda, me formei no ofício de agricultor e em agronomia. Vivemos 13 anos sem eletricidade, com pouquíssima água e uma estrada mal e mal trafegável. A escolha do lugar não respondia apenas a critérios agronômicos. Mas quando descobrimos a beleza daquele lugar, dissemos: "É aqui que queremos viver".
O essencial para nós era que este lugar nos alimentasse interiormente. Foi este lugar magnífico que nos deu tanta força, tanta coragem e energia. Assim, a nossa escolha não foi racional, mas derivava de uma busca. Estávamos em uma lógica de simplicidade deliberada. Além disso, nos contentamos com trinta cabras, enquanto todo mundo nos dizia que podíamos dobrar o nosso rebanho. Escolhemos a simplicidade como arte de viver.
Às vezes, você diz ter "uma contenda com a modernidade". O que pretende dizer com isso?
O progresso que nos foi vendido com a modernidade é uma ilusão. Não liberta, aprisiona. Desde a escola materna até a universidade, as pessoas ficam trancadas, todos trabalham em grandes ou pequenas "caixas" e se deslocam fechados em "caixas" (os carros). Depois, colocam-se os idosos em caixas para velhos à espera de da última caixa. O percurso de vida passa de um aprisionamento a outro com o mesmo sininho: "liberdade", "liberdade".
Mas onde está essa famosa liberdade? Para mim, eu a encontrei na simplicidade e na sobriedade, e não no "sempre mais" que está na base da ideologia moderna do progresso e que nos destrói, assim como destrói o planeta. Na minha campanha de 2002, fui o primeiro a pôr em discussão a ideia de crescimento econômico. A verdadeira provocação hoje é falar de decrescimento, evocar a possibilidade de rever as nossas atividades de modo a responder às nossas necessidades legítimas e reduzir a margem do supérfluo.
É preciso pôr em primeiro plano a tradição, contra o progresso?
É uma pena que tradições magníficas tenha se perdido. Isso realmente me desagrada. Eu trabalhei em Cévennes, por exemplo, onde conheci o que restava da verdadeira vida rural. Eu vivia com camponeses simples e tranquilos. O seu ritmo era cadenciado pelas estações. Estavam em osmose com a natureza. Além disso, você já percebeu? O agricultor não corre quase nunca e, quando corre, é desajeitado.
Por quê? Porque, em alguns aspectos, ele é regulado pela cadência da própria vida. Ele sabe muito bem que não se pode acelerar a frutificação de uma árvore. Você pode até se agitar, mas a macieira não lhe dará as suas maçãs antes de quando decidiu dá-las. Essa cadência eterna data das origens da humanidade. Com o mundo moderno, chegou a pressa, a aceleração, a velocidade e aquele ditado surpreendente que nos diz que "tempo é dinheiro".
Mas é realmente possível viver não de acordo com o ideal de modernidade?
Eu não defendo uma recusa radical da modernidade. O que eu reivindico é o direito ao inventário. E o mínimo que podemos dizer é que ele faz pensar. Hoje, as pessoas estão em superatividades, olham continuamente para as horas, tudo deve acontecer às pressas. De que servem as máquinas que inventamos? Certamente, não para aliviar as nossas vidas. Eu também possuo um carro e não uso velas para iluminação. Mas refletamos por um momento: todo o sistema moderno ruiria se não houvesse mais eletricidade ou combustível. O pequeno agricultor de Burkina Faso, ao contrário, continuará trabalhando a sua terra tranquilamente.
Nós nos tornamos dependentes das máquinas que criamos. Estamos continuamente na frente das nossas telas, com aquela necessidade permanente de estarmos "conectados". E essa dependência começa cada vez mais cedo. Até mesmo antes de tomar consciência da vida e de si mesma, a criança já está no virtual. Queima etapas fundamentais na sua relação com a matéria, com o tangível. Essa desvitalização precoce terá consequências. Estamos confundindo comunicação e relação. Que paradoxo: os instrumentos de comunicação fazem com que cada um fique em sua própria casa. Se existem extraterrestres, estou certo de que dizem entre si: "São superdotados, mas estúpidos".
Você foi muçulmano e depois cristão. Como a religião inspirou o seu pensamento?
Provavelmente, participou de alguma forma. A personalidade de Jesus, daquele homem nascido na Palestina e que prega o amor como a maior força que pode existir, me marcou muito. Mas adquiri um grande respeito pelas minhas duas religiões. Quando me interessei pela natureza e me tornei ecologista, entrei no mundo do grande mistério da vida. Às vezes, eu digo às pessoas: peguem uma semente de tomate, coloque-a na palma da sua mão e medite. Diga-se que há toneladas de tomates nessa semente. Há algo de incrível.
Neste momento, estou escrevendo o prefácio de um livro sobre agroecologia, onde parto da teoria de Lavoisier que diz que "nada se cria, nada se perde, tudo se transforma". Isso me causa problemas. Se nada se cria, então não há criador. Mas quando observo com amor e atenção a natureza e a vida, e medito sobre elas, não chego a concluir de que não há inteligência por trás de tudo isso. Inteligência e benevolência. Ora, eu não tenho respostas para essas perguntas. O que define Deus é o silêncio. Você pode sentir a sua presença profundamente. Com relação ao resto...
O que a atual crise econômica lhe inspira?
É preciso pôr-se de acordo sobre o que significa a palavra "economia". Hoje, parece que a economia consiste em buscar a melhor forma de fazer o máximo de lucro. E, partindo dessa definição, o planeta se torna uma jazida de recursos que devem ser transformadas em dólares. Se hoje há uma crise, é porque o dinheiro se tornou a única unidade de medida comum. Decretou-se que os países ricos em dólares ou em euros são os mais avançados economicamente. Que absurdo! Tirou-se da economia tudo o que não se traduz em dinheiro. Uma mãe de uma família que se ocupa do seu filho e os milhares de gestos que fazemos todos os dias nunca são levados em conta como parte da economia. Por quê?
Reflita por um instante sobre o incomensurável absurdo de uma frase como: "Neste país, as pessoas vivem com menos de um dólar por dia". Conheço vilarejos inteiros de 200 ou 300 habitantes que, todos juntos, não possuem mais do que 100 euros. Às vezes é trágico. Mas às vezes não. Essas pessoas vivem. Vivem das suas terras, do seu "saber-fazer", do seu esforço pessoal ou mesmo das sementes que possuem. É isso que lhes faz viver, não os dólares. O sistema econômico atual criou muito mais precariedade – tanto econômica, quanto psicológica ou espiritual – do que suprimiu. Para sair desse sistema, é preciso que a sociedade civil ponha em ação uma economia relocalizada, uma microeconomia que mobilize o máximo de pessoas de um determinado território.
Mas im número crescente de pessoas parece se preocupar com o ambiente, começa a comer produtos orgânicos... Isso deveria tranquilizá-lo.
De fato, é sempre uma alegria saber que muitos dos nossos concidadãos optam por comer de forma diferente, embora isso continue sendo anedótico com relação ao que está em jogo. No entanto, é preciso continuar. Além disso, se lançamos a campanha "Todos os candidatos de 2012 com o Movimento dos Colibris" (www.colibris-lemouvement.org), é justamente para trazer para exaltar e evidenciar essas iniciativas criativas que podem parecer limitadas no início. Muitas pessoas demonstram que é possível se alimentar de forma diferente, aprender de maneira diferente, educar de forma diferente... É o princípio do fermento. Quando fazemos pão, colocamos uma pequeníssima quantidade de fermento, mas ele se desenvolve de forma extraordinária. Acredito profundamente que essas iniciativas podem desempenhar um papel na mudança das nossas sociedades.
Uma vida
1938 – Nascimento de Pierre Rabhi em um oásis do sudeste argelino. Aos cinco anos de idade, foi confiado a um casal de europeus.
1960 – Sai de Paris para se estabelecer em uma fazenda em Ardèche. Forma-se em agricultura e se opõe à lógica produtivista.
1972 – Descobre a agroecologia, ou seja, como associar produção agrícola, proteção e regeneração ambientais. Ele aplica esse saber adquirido em sua fazenda e o transmite desde o fim dos anos 1970 em todo o mundo.
Livros
Du Sahara aux Cévennes: itinéraire d'un homme au service de la Terre-Mère (autobiografia), Albin Michel, 2002
Graines de possibile, regards croisés sur l'écologie, con Nicolas Hulot, Calmann-Lévy, 2005
Conscience et environnement, éditions du Relié, 2006
Manifeste pour la Terre et l'Humanisme. Pour une insurrection des consciences, Actes Sud, 2008
Éloge du génie créateur de la société civile, Actes Sud, 2011
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